30 de junho de 2010

O iogue e o dissidente

Um iogue octogenário que diz ter vivido mais de sete décadas sem beber ou comer tem causado espanto em cientistas do mundo todo. Prahlad Jani, de 83 anos, passou duas semanas sob constante observação de 30 médicos e de câmeras de filmagem, em um estudo que terminou em março deste ano. No período, ele não ingeriu nada, não urinou e nem defecou. O iogue alega que foi abençoado por uma deusa quando tinha oito anos e que isso lhe permite viver sem alimentos. Em 2003, segundo a BBC, ele já passara dez dias sob observação de uma outra equipe médica, também sem consumir nada, mas apresentando boa saúde mental e física.

Longe dalí, em uma pequena ilha do Arquipélago do Caribe, o estado de saúde de um outro homem que também não come e nem bebe nada continua se deteriorando. Seu nome é Guillermo Fariñas, psicólogo e jornalista que optou pela greve de fome para lutar contra os desmandos do governo cubano.

Tudo começou com a morte de um outro dissidente político chamado Orlando Zapata Tamoyo, no dia 23 de fevereiro deste ano. Tamoyo reivindicava melhores condições de vida para presos cubanos que permanecem detidos nas marmorras do regime castrista. Mas, depois de 85 dias de penúria, acabou falecendo. Sua morte coincidiu com a presença do presidente brasileiro Luis Inácio Lula da Silva, em Cuba. Indagado pelos jornalistas sobre este infeliz incidente, nosso guia se limitou a dizer "que é lamentável que uma pessoa se deixe morrer por uma greve de fome".

Em maio de 1981, quando o ativista irlandês Bobby Sands morreu depois de 66 dias de greve de fome em protesto contra as condições carcerárias a que eram submetidos os seus companheiros e pelo direito de ser considerado prisioneiro político, Lula afirmou que os "tiranos tremem na presença de homens capazes de morrer por seus ideais". Aliás, o próprio Lula recorreu à ferramenta política da fome quando foi preso pela ditadura militar. Quer dizer, não exatamente, pois alguns anos depois ele confessou que sua greve de fome havia sido uma farsa. Mas isso não importa! O fato é que antes de se tornar presidente da república, e posar para fotos de braços dados com ditadores como Fidel e Raul Castro, Lula reverberava o autosacrifício como arma política.

Ao condenar os "homens capazes de morrer por seus ideais" e sair em defesa dos seus algozes, Lula descortina o lado mais sombrio da sua personalidade. Na filosofia lulista do direito, a Lei de Segurança Nacional brasileira que condenou a militante Dilma Rousseff a 6 anos de prisão (das quais cumpriu três) ou a legislação do apartheid que aprisionou Nelson Mandela por 27 anos, por exemplo, não são menos legítimas do que as provisões das democracias. Se violam os direitos humanos, não há nada que líderes de outros países possam fazer, salvo afirmar que gostariam que isso não acontecesse.

Mas vamos voltar a Guillermo Fariñas...

Após a morte de Tamoyo, um outro dissidente político decidiu fazer greve de fome para pedir a libertação de 26 detentos em péssimo estado de saúde. Seu nome é Guillermo Farinãs e seu pedido é bastante razoável, tendo em vista que o número de presos cubanos vivendo em condições absolutamente inumanas já está na casa dos milhares.

Infelizmente, os dirigentes cubanos se recusaram a atender ao seu pedido e depois de vários e vários dias sem comer, o seu estado de saúde se deteriorou. Um dos médicos que o acompanham, declarou que a saúde dele piorou por causa de uma infecção e que nos últimos três dias "tem se complicado cada vez mais". O quadro inclui problemas hepáticos, a infecção causada por uma bactéria chamada "estafilococo" e a confirmação médica de um coágulo na jugular. A equipe médica está fornecendo um anticoagulante para tratar a trombose e recomendou que ele permaneça em repouso absoluto para evitar que o coágulo se desloque. Contudo, isso é apenas um paliativo.

Farinãs sabe disso e já fez, inclusive, os preparativos para a sua morte. Ele deseja que o ex-presidente polonês Lech Walesa deposite flores sobre sua tumba. É pede ao músico Willy Chirino, exilado em Miami, que visite seu túmulo e cante Ya viene llegando la libertad (Já vem chegando a liberdade). "Hoje, que meu povo vive iludido, eu me sinto inspirado, e um som estou cantando, anunciando a todos os meus irmãos que nosso dia já vem chegando". Claro, seus pedidos só irão se realizar no dia em que os Castro baterem as botas e aquela ilha, enfim, se tornar um país democrático. Vamos torcer para que Raul não seja tão longevo quanto o seu irmão Fidel, do contrário o presidente polones e o músico exilado podem acabar morrendo antes de terem a chance de realizar o pedido de Fariñas.

Lembram-se do líder estudantil Pedro Luis Boitel? Pois é! Ele também morreu depois de uma greve de fome. Boitel, estudante de engenharia, não aceitou a ditadura de Fidel e "foi condenado a dez anos de prisão e encarcerado num estabelecimento particularmente duro: Boniato". Morreu, depois de 53 dias, sem nenhuma assistência médica. Naquela época, Cuba era vista como o paraíso na Terra. Foi a morte de Boitel que fez com que o mundo acordasse do sonho e atinasse para a realidade. Um dia, quando os cidadãos cubanos pararem de sacrificar as suas vidas em nome dos seus ideais, o mundo reconhecerá que foi omisso e tratou a ilha com menoscabo. Mas, enquanto isso não acontece, é de suma importância que o mundo continue a procura de soluções capazes de tornar a vida dos dissidentes políticos cubanos um pouco menos dolorosa.

Eu já tenho uma sugestão! Sugiro aos dissidentes políticos cubanos que se correspondam com o iogue indiano e peçam, em nome de tudo que é mais sagrado, a sua receita. É triste dizer isso, mas há menos que eles consigam passar dois, três, quatro meses sem comer... O resultado continuará a ser o mais trágico e desfavorável possível. Afinal, os Castro já provaram que os tiranos não tremem - e tampouco cedem - diante dos homens que estão dispostos a sacrificar as suas vidas por um ideal.

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Um comentário:

  1. Eu não entendo porque agente não vai lá e solte
    na marra essas pessoas e se tem que custar a vida de alguém que custe as dos ditadores.

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