18 de junho de 2010

A morte do velho portuga

Morreu aos 87 anos o escritor português José Saramago, prêmio Nobel de literatura. Lamentei profudamente o seu falecimento, apesar de não ser um grande fã da sua obra. Suas "inovações" nunca me interessaram e a sua tão elogiada "técnica" não passava de um maneirismo. Seu "estilo" não me agrada e nãome diz absolutamente nada. Ou melhor, diz sim: sua sintaxe de exceção, as vozes do discurso que vão se misturando, aquele fluxo de pedregosa verborragia, aquela mistura de tempos, tudo aquilo vai me cansando.

Não li seu último livro, Caim, porque O Evangelho Segundo Jesus Cristo - um livro primitivo na forma e simplório no conteúdo - coneguiu matar o pouco apreço que eu nutria por ele. Ralph Emerson, escritor norte americano, dizia que o talento sozinho não consegue fazer um escritor; deve existir um homem por trás do livro. Eu vou além e afirmo que é o caráter do escritor que define a sua importância aos olhos do público. É claro que sei distinguir as escolhas ideológicas do escritor dos recursos estéticos empregados em sua obra, mas prefiro quando o próprio escritor é capaz de fazê-lo. Acho que isso facilita a vida do leitor e contribui sobejamente para que não se criem equivocos a respeito das reais itenções do autor. Infelizmente, Saramago nunca primou por este quesito.

Em Alem do Bem e do Mal, Nietzsche critica a moral cristã. Em O Evangelho Segundo Jesus Cristo, Saramago critica os cristãos. Como podem ver, a diferença não está apenas na forma da sua crítica, como também no seu conteúdo. É fácil compreender porque o portuga julgou adequado inveter o teor da mensagem contida nos evangelhos. No fundo, ele sabia que jamais seria perturbado, pois o cristão é, em essência, um cordeiro que segue fagueiro para a imolação, sem reclamar de nada. Por essas e outras, O Evangelho Segundo Jesus Cristo é um livro execrável. Na literatura, não se desconstrói a religião sem se apaixonar pelo fato religioso. O pio Dostoievski conseguiu ser muito mais duro com Deus cristão sem, no entanto, ser ofensivo ou desairoso com os próprios critãos.

Há quem diga que eu exagero nas restrições de natureza ideológica e deixo de lado a obra propriamente dita. Discordo, pois na prosa literária as deliberações do escritor são tão importantes quanto a sua narrativa. Sempre achei que o conteudo é inúmeras vezes mais importante que a forma, por isso costumo me indagar o que exatamente o escritor quis dizer quando recorreu a tais e tais recursos estéticos em sua obra. Ser "inventivo" não é o mesmo que ser "progresista", pois a inventividade nem sempre colabora para a evolução das ideias. Ao contrário, na maioria das vezes, aquilo que é chamado de "inventividade" não passa de um excesso de brocados supostamente "modernizantes".

Não sei se é para o bem ou para o mal, mas não consigo ler um livro sem atinar para o fato que ele é um reflexo cabal da escolha política, ética e ideológica do seu autor. Tenho um pé um atrás com determinados escritores que alegam dedicar a sua obra a um "propósito maior". A arte existe para que a realidade não nos mate. Logo, não pode ser tratada como um simples reflexo daquilo que vivemos. Claro, essa é apenas a opinião de alguem que acredita que a arte, quando é usada para transmitir uma ideia ou uma ideologia, se tranforma em propaganda.

Saramago nunca compartilhou desse pensamento e a exemplo de outros escritores igualmente renomados, pôs sua obra a serviço de uma ideologia. Ele morreu defendendo o "socialismo real", uma filosofia incompatível com o livre pensar e com a criação artística genuína. Atrevo-me a dizer que os intelectuais e acadêmicos que aderiram a essa ideologia, se transformaram em máquinas de proselitismo à serviço de um partido. Mikhail Bulgakov, por exemplo, se negou a desempenhar esse papel e como resultado, acabou sendo perseguido por aqueles que Saramago tanto admirava. Em um certo momento da sua vida, chegou a dizer: "Se um escritor quisesse demonstrar que a liberdade não lhe é necessária, pareceria um peixe querendo convencer-nos de que a água não lhe é útil".

É triste dizer isso, mas na minha opnião a obra do português da Província do Ribatêjo serviu apenas para embaçar o trabalho de Antônio Lobo Antunes, um literáto melhor e mais inventivo. Justo Lobo Antunes, que ao contrário de Saramago não deve a sua acensão a uma patota comunista. Justo Lobo Antunes, que sempre acreditou em ideais como justiça e liberdade. Realmente lamentável...

No fundo, a morte de Saramago nos deixou uma única certeza: o sucesso retumbante de alguns escritores não têm absolutamente nada a ver com o seu talento, mas sim com à afinidade entre a mediocridade das suas idéias e as dos seus leitores.

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